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quinta-feira, 8 de outubro de 2015

O bebê de Rosemary

Com Leo Davine.
Confesso que sempre gostei de filmes de terror, mesmo que ficasse de olhos abertos a noite inteira depois de assistir a eles. Minha mãe não deixava que eu os visse, mas, na casa de minha finada avó, os tios e tias me davam passe livre. Depois, eu os aborrecia com meus medos e minha insônia.

Os tempos eram outros. Era um Brasil recém-saído da ditadura. As grades de programação dos canais de TV não sabiam muito bem o que fazer com tanta liberdade, ainda que tardia. As madrugadas traziam enxurradas de terror. Velhos filmes do Drácula, alienígenas sanguinários e canibais insaciáveis se infiltravam nos cérebros adolescentes. Quem tinha dinheiro e uma carteirinha falsificada podia frequentar os cinemas (havia cinemas no centro das cidades!) e se gabar diante dos fedelhos que não gozavam desta benesse. Ô tempo!

Então, depois de muito anúncio, reprisaram, na TV, O Bebê de Rosemary.

Na escola, no dia seguinte, ninguém falava de outra coisa. Uns não tinham sentido medo, outros mijaram nas calças, outros levaram umas chineladas para espantar o sono matinal. De toda forma, aquilo havia criado tantas raízes na cabeça dos moleques, que alguns deles, já marmanjos, passaram a alugar o filme toda semana. Viciaram-se a tal ponto que já não davam atenção à namorada ardente de paixão, ao cachorro morto de fome, às mães que viajavam 600km para vê-los. O programa de sábado à noite era O Bebê de Rosemary com vinho e canapés. A namorada que assistisse ao filme com o marmanjo...

Pois bem. Uma namorada de um marmanjo desses não suportou a rotina. Mandou o sujeito andar. E que levasse, também, a Rosemary, o bebê e até o disco do Chico que ele roubou. O marmanjo percebeu que o namoro fez água, mas parece que, até hoje, não acordou do próprio filme de terror.

Jamais compreenderei a troca da companhia da namorada pela do Bebê de Rosemary. O marmanjo, sem perceber a gravidade da barganha, assumiu o ônus de uma permuta com prejuízo. Azar o dele.


LEONARDO DAVINE DANTAS é mineiro de Lavras, residente em Campinas. Bacharel em Letras pela Unicamp, atua como servidor público do Estado de São Paulo. Seus autores prediletos são o poeta Virgílio e o Padre Manuel Bernardes.

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