Fã de Toquinho e Yamandú Costa, Fábio Gonçalves se diz mais técnico do que artista (Fotos: Tarso Zagato) |
Criador de uma série com
mais de 100 instrumentos, o luthier Fábio Gonçalves abre as portas de sua
oficina ao Letra e Cultura.
Quando o dom e a arte se encontram,
coisas maravilhosas costumam acontecer. A madeira mais rústica, em mãos
habilidosas, transforma-se em tampos, braços, trastes, pestanas, rastilhos e
cavaletes, cada qual perfeitamente alinhado e moldado para formar o todo
ressonante, que em mãos musicais encontra outro dom. De artista para artista,
arte para produzir arte.
Neste contexto está o luthier – do francês
luth, nome dado ao artesão que
fabrica ou repara instrumentos de corda com caixa de ressonância. Preciso como
as notas que compõem a mais bela canção, molda, solitário e abnegado,
instrumentos musicais prontos para entoar beleza e emoção.
Entre poucos e raros, um guaçuano se
destaca: Fábio Gonçalves “Luthier”. A exímia perícia que emprega em seus
instrumentos lhe valeu a fama que o precede e o equivocado sobrenome que
designa seu virtuoso ofício.
Oito anos se passaram desde que se descobriu
artesão e mais de 100 instrumentos ganharam forma em suas mãos. Apesar disso,
nega com peculiar humildade o status de artista, aparentando ignorar o
exacerbado prestígio que ostenta entre os músicos que conhecem e admiram seu
trabalho.
Com a modéstia que lhe sobra, permite-se
um sonho pueril: ver Toquinho ou Yamandú Costa dedilhando arte em um
instrumento de sua criação. Na opinião de muitos, um sonho mais possível do que
distante.
"Paciência e dedicação são as palavras-chave para um bom luthier." |
LETRA & CULTURA: Quando você descobriu que poderia fazer instrumentos de
corda?
Fábio
Gonçalves: Para falar a verdade, não foi uma coisa que eu procurei. Um dia, eu
cheguei na casa do meu pai e tinha um recado do Carlos Bicalho querendo falar
comigo sobre violão. Na época, eu dava aulas de violão e pensei que fosse um
aluno, aí eu retornei para ele. Ele disse que era luthier em Campinas e que eu
havia deixado o meu nome com ele para fazer um curso de luthier. Eu não me
lembro de ter deixado o nome com ele (risos)... mas acredito que tenha sido
quando passei um dia que visitei o Conservatório Carlos Gomes, onde eu queria
estudar, e acabei preenchendo uns formulários que deixaram por lá. Na mesma
semana, por coincidência, um amigo viu um cartaz do mesmo curso em uma loja de
música em Artur Nogueira e me convidou para fazer. O interessante do curso era
que você aprendia a fazer um violão e saia com um instrumento, e eu sempre tive
o sonho de ter um instrumento de um luthier, feito à mão. Assim que entrei na
oficina e vi o Carlos Bicalho fazendo um instrumento, eu me apaixonei na hora.
L&C: Assim como um pintor ou um escultor, você produz arte e, portanto,
também é um artista. Como tal, você segue algum processo ou “ritual” artístico
na elaboração de suas peças?
Fábio
Gonçalves: Eu aceito e até agradeço ser chamado de artista. Mas acredito que
meu trabalho é mais técnico do que artístico. A parte artística está mais
relacionada com o acabamento do violão, na hora de colocar um filete ou fazer
um cavalete legal. De qualquer forma, não obedeço a nenhum ritual, mas preciso
estar inspirado para criar.
Fábio
Gonçalves: Ainda sim, eu me considero mais um técnico do que um artista. Eu
agradeço quando o pessoal me chama de artista, mas penso que mesmo quem pinta
um quadro, ou toca uma canção, é claro que há uma inspiração, existe um dom
naquilo, mas acredito que muita parte é técnica também.
L&C: Seu raciocínio me permite pensar que qualquer pessoa comum pode se
tornar um luthier.
Fábio
Gonçalves: Eu acho que sim. Basta que a pessoa tenha paciência, capricho e
dedicação. A grande diferença entre um luthier que faz um instrumento melhor e
outro que faz um não tão bom é a experiência. Por isso respeito os luthiers
mais velhos, pois aprendo muito com eles.
L&C: Na prática, qual é o ganho que um músico tem ao adquirir um
instrumento feito por um luthier?
Fábio
Gonçalves: A vantagem é que os instrumentos são feitos respeitando as
determinações do cliente e o que ele espera de som. A gente conversa bastante
com o cliente para saber exatamente o que ele quer. Tem gente que gosta de
braço mais largo, outros mais fino. Tem gente que toca mais forte, outros tocam
mais leve. É um instrumento feito sob medida para o músico.
Para o luthier, o próximo instrumento é sempre o melhor. |
L&C: Em oito anos como artesão, você já produziu uma série de 101
instrumentos. Há algum que te marcou ou que é o seu preferido?
Fábio
Gonçalves: Eu acho que não. O luthier sempre acha que o melhor instrumento é o
último que ele fez. Dizer que eu tenho um carinho especial por um determinado
instrumento não é verdade. Todos eles são diferentes e o que importa é atender
às expectativas do músico.
Agradeço imensamente pela oportunidade de mostrar meu trabalho aqui no Letra e Cultura. Fiquei muito feliz e muito satisfeito em participar deste jornal que tanto valoriza nossa cultura. Parabéns a todos!
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